segunda-feira, 3 de julho de 2017

Analógico vs. Digital

Projetores: analógico e digital, na cabine de projeção.
Imagem reproduzida do Google e postada por "Máquina de Cinema, 
para ilustrar o presente artigo.

Publicado originalmente no Hollywoodiano, em 19 de novembro de 2015.

Analógico vs. Digital.
Por Otávio Almeida.

Crônica de um cinéfilo carioca sobre o saudosismo da projeção analógica e a realidade do digital

Sei que cheguei ao futuro quando me dou conta de que vim da época em que o cinema contava somente com projeção analógica. Deve ter sido a mesma sensação de meus pais e avós, que eram do tempo de outras invenções, como a máquina de escrever, o telefone com fio, chuveiro a gás, a televisão de tubo e a carta escrita à mão.

Para funcionar como se espera, pelo menos no Brasil, a mudança do analógico para o digital precisa superar o tópico da nostalgia. Vamos voltar um pouco: se os multiplexes não estivessem no mercado, provavelmente o passatempo (ou o vício) de ir ao cinema teria desaparecido ou diminuído drasticamente há 15 ou 20 anos. E ir aos cinemas de rua na proximidade da virada do século não era mais um programa seguro para famílias, afinal assaltos se tornaram frequentes e a manutenção das salas andava relaxada demais. É o que acontece com quem não evolui.

Mas presenciei essa mudança com muita dor no coração, porque cresci no bairro da Tijuca, no Rio de Janeiro, onde diversos cinemas se espalhavam pelas calçadas, com filas desconfortáveis se espremendo entre outras pessoas com muita pressa, que tinham objetivos diferentes de quem naquele instante se preparava para assistir a um filme já sentindo o cheiro de pipoca que vinha lá de dentro.

Viu? Nostalgia pode ser algo bom, mas ela entra em você de um jeito que não solta mais. Ela ameaça dominar nossas ações e tenta impedir que a gente siga em frente, deixando eu e você presos no passado, como a película fotográfica das salas que representavam a “Segunda Cinelândia Carioca”. Comparada às definições de hoje – padrão nos lugares mais desenvolvidos do mundo -, os filmes desse sistema ultrapassado, que ainda resiste no Brasil, oferecem uma imagem suja, sem cor ou brilho. Até mesmo arranhada. Isso porque os cinemas recebiam cópias da cópia e os projecionistas eram obrigados a tocar nos filmes, além de cortar e emendar rolos. Sua existência representa pura nostalgia, preguiça ou desejo de não gastar com equipamentos e reformas nas salas de cinema. É verdade que tudo tem um custo, mas o melhor resultado vem em longo prazo.

Pena, no entanto, que empregos como os dos projecionistas estejam em risco. Mas se não pensarmos adiante, ficaremos para trás como cinemas que marcaram a história do Rio, e permanecem extintos, como o América e o Carioca, onde vi filmes “antigos”, e no velho formato, como Jurassic Park, Dança com Lobos, Duro de Matar 2, De Volta Para o Futuro I, II e III. Era o que tinha para a época, mas imagine se esses filmes tivessem sido criados para exibições digitais, a exemplo do que fazem hoje cineastas como James Cameron, em Avatar, e Peter Jackson, em O Hobbit.

A tecnologia está em toda parte, embora a gente nem perceba sua presença. Hoje, ela é notada quando falha ou quando não está disponível em determinado lugar. Isso para afirmar que o público deste século não assistiria a Star Wars ou Jogos Vorazes com qualidades de imagem e som inferiores ao padrão atual. Quem viu As Aventuras de Pi e A Invenção de Hugo Cabret, certamente não vai chorar pela projeção analógica. E se Quentin Tarantino defende a película até a morte, temos um cineasta muito mais velho como Martin Scorsese estudando e apoiando cada vez mais o digital.

A respeito das salas de cinema, as cópias digitais são mais baratas e oferecem resoluções próximas à perfeição. Não exigem outras cópias, o que gera uma baita economia. Além disso, os distribuidores reduzem custo com o fim do transporte dos rolos de filme. Em breve, todas as salas serão capazes de projetar qualquer mídia digital, incluindo a possibilidade de transmissão simultânea ou ao vivo. O esforço é apertar play e deixar o computador trabalhar. É um desafio e tanto para líderes de estúdios, distribuidoras e exibidores, mas o digital provoca mudanças na vida e em todos os setores.

É uma evolução que chegou às indústrias da música e dos games, e são poucos os que ainda pedem discos de vinil ou jogos de Atari. Também aceitamos a mudança do modo como vemos filmes em casa. Alguém ainda vai à locadora do bairro? O streaming veio para ficar e aposto que você tem preguiça de vez em quando na hora de pegar não o DVD, mas seu Blu-ray da estante, ou do armário, tirar a poeira da caixa, abri-la, pegar o disco, apertar eject no Blu-ray Player, esperar alguns segundos até o conteúdo ser carregado e dar início às propagandas e trailers. Quando o filme começa mesmo? Ainda nem chegamos ao menu principal.

O ponto é que não devemos parar no tempo. Entenda que o futuro vai virar passado e tudo isso que falamos aqui terá cheiro de mofo. Mas e quanto a você?

Texto reproduzido do site: hollywoodiano.com.br

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