terça-feira, 5 de agosto de 2014

Homenagem a Archimedes Lombardi



Publicado originalmente no blog Western Cinemania, em 8 de dezembro de 2011.

Archimedes Lombardi agraciado com o prêmio "Cinema" do IBAC 
Por Darci Fonseca.

Há 32 anos um apaixonado por cinema exibe filmes em 16 mm nos circuitos alternativos de São Paulo. Seu nome é Archimedes Lombardi, nascido na pequena cidade de Santo Anastácio, mas radicado em São Paulo há quase 50 anos. Quando aqui chegou o cinema brasileiro efervescia com autores como Anselmo Duarte, Luís Sérgio Person, Joaquim Pedro de Andrade, Glauber Rocha, Rogério Sganzerla, Ozualdo Candeias e outros. Archimedes tornou-se um cinéfilo verdadeiro, não só pela frequência com que ia aos cinemas da Cinelândia Paulistana mas e principalmente aos cinemas do bairro que escolheu para viver, o histórico Ipiranga. Com seu jeitão simples, extrovertido e bonachão Archimedes se aproximou e se tornou amigo de cineastas, produtores e atores. Chegou até mesmo a fazer figuração em filmes, no “Cinema da Boca”, num tempo em que era magro e tinha vasta cabeleira. Como no Brasil cinema nunca foi uma atividade muito confiável, Archimedes ganhava a vida como gráfico, inicialmente exercendo a profissão de linotipista, a mesma que Anselmo Duarte (Zé do Lino) tinha em “Absolutamente Certo!”. Mais tarde Archimedes tornou-se empresário do ramo gráfico, atividade que mantém até hoje, aos 68 anos de idade.

ARCHIMEDES E SEU PROJETO CULTURAL - Tanto Archimedes gostava de filmes que passou a colecioná-los, isto num tempo em que nem se falava em VHS. Sua coleção tomou forma mesmo com as latas redondas que guardavam os inestimáveis celulóides em 16 mm. Paralelamente a sua atividade profissional como gráfico, Archimedes Lombardi fundou a Associação Brasileira dos Colecionadores de Filmes em 16 mm, que reunia outros colecionadores e mantinha intercâmbio com apaixonados como o também linotipista Ângelo Paulino, dono de um fantástico acervo. Foi então que Archimedes teve a idéia de exibir seus raros filmes em 16 mm, filmes de há muito fora de circulação e que eram apenas doce lembrança na memória de quem gostava de cinema. Archimedes bateu então à porta da Secretaria Municipal de Cultura e conseguiu espaço na Biblioteca Municipal do Ipiranga, hoje “Biblioteca Temática Roberto Santos”, em homenagem ao importante cineasta paulistano. Autorizado pela Prefeitura Archimedes Lombardi passou a promover sessões semanais, sempre aos sábados à noite, ali na Rua Cisplatina, aos pés da Colina Histórica, no mais paulistano dos bairros, o Ipiranga. À medida que os cinemas se tornavam estacionamentos, supermercados ou igrejas, mais aumentava a frequência das sessões da Biblioteca do Ipiranga que muitas vezes era pequena com seus 160 lugares para acolher tantos espectadores. As sessões, claro, eram gratuitas, mas a satisfação de Archimedes Lombardi atrás de seu projetor vendo a sala sempre lotada era a sua mais inestimável recompensa.

FILME RARO DE CARLOS REICHENBACH - Essa atividade prosseguiu por anos a fio, por mais de três décadas. Sempre que possível Archimedes Lombardi convidava personalidades ligadas ao cinema para fazer palestras antes das exibições, entre elas escritores como Antônio Leão da Silva Neto, críticos como Rubens Ewald Filho, produtores como Ari Fernandes, lendas vivas como o ator Carlos Miranda e cineastas como Anselmo Duarte e Carlos Reichenbach. A amizade de “Carlão” Reichenbach com Archimedes Lombardi começou quando alguém avisou Reichenbach que seu primeiro filme, “Paraíso Proibido”, seria exibido numa sessão lá na Biblioteca do Ipiranga. Para “Carlão” aquele filme estava desaparecido e o diretor não acreditou que o filme ainda existisse pois sabia-se que nenhuma cópia havia sobrevivido. Porém a única cópia existente estava até que bem preservada na coleção de Archimedes Lombardi para alegria de Reichenbach que havia se tornado o principal cineasta de São Paulo com filmes como “Lilian M. – Relatório Confidencial”, “Alma Corsária” e “Garotas do ABC”.

CARINHO PELOS COWBOYS - Archimedes Lombardi tem gosto bastante diversificado, ou melhor, não há gênero de filme que esse misto de colecionador-gráfico-agitador cultural não aprecie. Raridades do cinema mexicano, europeu de modo geral, filmes de Kurosawa, Yasujiro Ozu, filmes noir, terror, melodramas, musicais e certamente faroestes. Este último é um gênero pelo qual Archimedes tem especial predileção, até porque no Cine Guarani, a única sala exibidora, lá de Santo Anastácio o que mais Archimedes assistia eram faroestes de Buck Jones, Hopalong Cassidy, Roy Rogers, Rocky Lane e outros. E durante a semana, após as aulas, a brincadeira preferida dos meninos da cidade era brincar de mocinho e bandido nos cenários de Santo Anastácio, cenários que muito se assemelhavam a Corriganville, Iverson Ranch e Alabama Hills. Com esse carinho pelo faroeste, Archimedes tem entre seus amigos os cowboys paulistanos da confraria dos amigos do western.

PRÊMIO IBAC DE CINEMA - Após tantos anos de dedicação quase anônima ao cinema, especialmente em relação aos filmes em 16 mm, o Instituto Brasileiro de Arte e Cultura - IBAC, em sua premiação do ano 2011, reconheceu a inestimável contribuição de Archimedes Lombardi à preservação e divulgação dos filmes em 16 mm, concedendo a ele Archimedes, o Prêmio IBAC 2011 da Categoria Cinema. A cerimônia de premiação ocorreu no Auditório da Aliança Francesa, em São Paulo, no dia 23 de novembro último, tendo como Mestre de Cerimônias o ator Milton Gonçalves. Curiosamente, aquela mesma sala da Aliança Francesa onde 50 anos antes Archimedes Lombardi assistiu aos clássicos de René Clair, Jean Renoir, Jacques Tati e aos primeiros trabalhos de Godard, Truffaut, Chabrol e outros, serviu de palco para que o nome de Archimedes fosse aplaudido por seus amigos, familiares e principalmente pelos admiradores de seu maravilhoso trabalho em prol do cinema. Parabéns, Commendatore!


Texto reproduzido do blog: westerncinemania.blogspot.com.br

Foto: ibacbr.com.br

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